L’Intemporel
“Los meses y los días son viajeros de la eternidad. El año que se va y el que viene también son viajeros. Para aquellos que dejan flotar sus vidas a bordo de los barcos o envejecen conduciendo caballos, todos los días son viaje y su casa misma es viaje.”
Matsuo Bash
Sendas de Oku, Século XVII
É verdade que o tempo passa? E, em sua suposta pressa, ordena o rumo de coisas físicas e imateriais? O tempo ilumina o caminho, impõe regras?
A arte atual, mercantilizada, tenta nos rotular. Na minha pintura, contudo, se há um tempo, ele remete ao poético, ao lúdico, ao experimento e ao fazer; se o tempo são os vários tempos que se chocam e se misturam, como as marés ou os seixos e aluviões dos rios de minhas pátrias, minha pintura é um extrato de entropias que recorrem ao meu passado de menino, quando sonhava inventar mundos; se o tempo flui como as águas dos rios e os ventos da madrugada, buscando um lugar no futuro, tal qual um abrigo em algum canto do firmamento ou no azul cobalto de um mar, o meu tempo recorre.
Mostro agora uma seleta de obras executadas entre 2016 e 2023. São pinturas a óleo, têmperas, aquarelas e objetos que compõem um pequeno lago em face da realidade oceânica de meu trabalho. Todas ostentam o emblema do tempo e sua secreta geografia, sem esperanças darwinistas – afinal, se houvesse uma evolução em arte, como exaustivamente proclamado pelas vanguardas do século XX, não estaríamos no cul-de-sac em que nos encontramos.
Algumas foram produzidas em Bethany, Connecticut, onde passei três meses, convidado pela Josef & Anni Albers Foundation, do dia 3 de março ao final de maio de 2020. No ano anterior, Denise e eu havíamos passado longas temporadas em Alphabet City, Nova York, na nona rua, entre as avenidas C e D. Charlie Parker viveu ali, e sempre que eu atravessava a Tompkins Square, ouvia o eco de sua música.
As demais foram feitas em meus ateliês de Paris, de Madrid e de Vargem Grande, em Teresópolis. Poucas, iniciadas há mais de vinte anos. Tempus fugit. A permanência pode ser um parâmetro, mas nunca um limite.
Esta mostra é ainda uma homenagem a alguns artistas brasileiros com quem convivi e guardo especiais lembranças - Iberê Camargo, José Maria Dias da Cruz, Rubem Grilo, Gianguido Bonfanti, Luciano Figueiredo, João Atanásio, Maria Leontina, Alfredo Volpi, Ione Saldanha , Abelardo Zaluar, Rubens Gerchman, José Paulo Moreira da Fonseca e Djanira da Mota e Silva. Dedico-a, com carinho, ao pintor Sérgio Lucena, meu mais novo velho amigo.
Gonçalo Ivo
Vargem Grande, 13 de agosto de 2023.
*Tradução de Octavio Paz e Eikichi Hayashiya, primeira edição, Seix Barra, 1981.