Niobe Xandó
Niobe Xandó (Campos Novos Paulista, São Paulo - 1915-2010) foi uma artista autodidata com mais de cinco décadas de trabalho consistente. O desvio de qualquer corrente artística ou movimento de contornos nítidos é possivelmente a única característica consistente na trajetória da artista. Sua pesquisa de maior destaque parece aterrar a produção de Xandó a um confronto existencial intrínseco ao indivíduo contemporâneo: o encontro da espiritualidade de um mundo arcaico com o progresso tecnológico da sociedade urbana.
Após o contato inicial com o figurativismo da vida prosaica brasileira, Xandó desencadeia a busca incessante pelo universo metamórfico da fantasia na natureza. Xandó se volta à produção de suas Flores fantásticas, em que composições abstratas rivalizam composições florais que, por sua vez, dão lugar a seres híbridos. Um mundo bizarro e viscoso de figuras que são, ao mesmo tempo que anunciam o que deixarão de ser. Por toda a década de 1960, Xandó desenvolveu cuidadosa a busca de uma escrita fundamentada em signos que se tornam símbolos para criar nova forma de comunicação na eterna ponte entre o verbo e a imagem. Durante o período vivido na França, a artista entra em contato com o movimento letrista, a partir do vínculo com o ex-dadaísta Maurice LeMaître. Apesar do convite feito a ela para somar-se ao movimento, Xandó segue sua pesquisa independente. “O meu problema com as letras é o de contrair, isto é, eliminar linhas, escrever o máximo com o mínimo das mesmas”, comentou a artista. Dona de um estilo completamente único, Xandó não só criava uma nova linguagem, mas havia inventado um código, um gênero de ideograma “pós-alfabético” capaz de articular uma mensagem que contava o Brasil como tanta força como movimentos como a Bossa Nova ou o Cinema Novo.
Durante o breve período vivido na Bahia, Xandó reconhece a entranhada presença da matriz africana na cultura nacional brasileira. A partir de então, criou máscaras e totens de forte representação e delicada beleza. Esta fase também somou seus estudos sobre as artes pré-colombiana e indígena brasileira. Rubem Valentim, um dos grandes artistas brasileiros, que distingue a produção de Xandó definindo-a como “a primeira artista brasileira da textura”, pelo tratamento da pintura matérica que remetia aos gestos do fazer popular, no qual a mão da artista e os materiais estavam muito presentes na superfície da pintura.
É na contra-mão das tendências da arte concreta e, logo, pela arte conceitual dos anos 1970 que Xandó crava sua independência estilística. Embora vertentes do dadaísmo e surrealismo sejam identificadas nas telas deste período, Xandó não se filia a qualquer movimento. A mutação do ser e seus signos lhe interessavam. A este jogo de forças perene entre a ideia de sacralidade de um mundo anterior e a velocidade imprimida nos corpos pela evolução tecnológica, Xandó deu o nome de Mecanicismo. É assim que surgem seus seres unicelulares, totêmicos, planares no espaço pictórico, além da investigação gráfica da palavra.
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