The Speed of Grace
"A liberdade não se implora, se conquista." - Abdias do Nascimento
"Art has the power to challenge norms, disrupt narratives, and reshape the world." (A arte tem o poder de desafiar normas, disputar narrativas e reformular o mundo.) - Caleb Azumah Nelson, “Open Water”
“The Speed of Grace” é uma exposição coletiva que examina detalhadamente como os artistas visuais que representam o espectro da diáspora africana usam sua prática artística como uma plataforma para aprofundar e expor estruturas críticas que moldam a cultura contemporânea. Esses artistas produzem obras que revigoram caminhos inventivos de expressão cultural e provocam questionamentos, promovendo diversas formas de criatividade que utilizam materiais como fibras de palmeira, durags, sherpa, miçangas e papel de arroz para criar pinturas, esculturas e colagens que desafiam as definições convencionais de arte. Ao ampliar estas perspectivas afro-atlânticas e ao dissipar estereótipos que muitas vezes rotularam injustamente os artistas negros (black and brown)¹ como pouco sofisticados ou naifs, esta exposição presta homenagem à profundidade e complexidade da produção cultural proveniente da diáspora africana. Isto é especialmente digno de nota dados os esforços históricos para obscurecer as suas contribuições inestimáveis para a narrativa da história da arte.
“The Speed of Grace” aventura-se em um campo onde os artistas exploram a consciência coletiva da diáspora, filtrando as suas perspectivas por meio dos prismas do mito, folclore, história, imaginação e experiências pessoais. Cada artista apresentado nesta exposição incorpora o espírito de indivíduos que aproveitaram a sua arte para estabelecer uma contra-narrativa que abrange a autoconsciência, a intimidade e a desenvoltura. A construção deste conjunto de artistas situa a mostra como uma plataforma para pensar coletivamente sobre ideias pan-africanas e imaginar novos futuros encarnados e animados por vozes para aqueles que historicamente existiram à margem. Através da ação coletiva, as comunidades diaspóricas são empoderadas e podem exercer a sua influência para mudar o mundo. Os artistas apresentados em “The Speed of Grace” pensam como suas práticas podem desafiar estruturas de poder estabelecidas, questionar normas sociais e articular perspectivas diferenciadas, não-monolíticas e expansivas sobre as comunidades negras e pardas.
O contexto conceitual de “The Speed of Grace” deriva de um retumbante ethos Pan-Africanista. Este movimento procura fortalecer laços de solidariedade entre diversas comunidades nativas e diaspóricas de ascendência africana. Ao oferecer à comunidade artística brasileira um encontro imersivo com uma diáspora artística africana mais ampla, a exposição tenta ampliar o sistema de raízes que sustenta o tecido da diáspora. Este esforço conecta-se apropriadamente com histórias de experiências negras, pardas e indígenas em várias diásporas, ressoando com as identidades multifacetadas dos visitantes, ao mesmo tempo que destaca as camadas compartilhadas que unem a sociedade humana. “The Speed of Grace” apresenta artistas da diáspora, locais e internacionais, que exalam engenhosidade criativa em sua prática. A exposição é ancorada por um ilustre grupo de artistas brasileiros como Larissa de Souza, Zéh Palito, Mestre Didi e Emanoel Araujo, que, por meio de suas práticas, ajudaram cuidadosamente a dar forma à exposição, criando macro e micro conversas entre as obras. Por exemplo, a justaposição de “Oxumaré (2022)”, de Emanoel Araújo, e “The 400 Colors of A Pearl/Los 400 Colores de Una Perla (2023)”, de Bony Ramirez, instiga um discurso convincente sobre o queer, a cor, a natureza e o misticismo ao lançar mão de abstração geométrica e realismo mágico, respectivamente. Esses momentos, salpicados ao longo da exposição, motivam o espectador a desenvolver vínculos estéticos e conceituais com os trabalhos apresentados, cultivando uma experiência profundamente pessoal e reflexiva.
Baseando-se abertamente na sua herança caribenha, africana e americana, estes artistas exploram um vasto reservatório cultural para criar as suas obras. Seus pontos de vista distintos permitem-lhes entrelaçar memória, curiosidade e um desejo fervoroso de dar origem a novas narrativas em suas criações artísticas. Ao fazer a curadoria do conjunto de artistas apresentados em “The Speed of Grace”, tive como objetivo construir uma ponte criativa que transcende as limitações das fronteiras geográficas, conectando artistas do Brasil ao resto da diáspora e vice-versa. Este esforço procura tecer uma intrincada tapeçaria de narrativas e experimentação artística, enriquecendo tanto os artistas como o público. Como ganês-americano de primeira geração, minha jornada pelo Brasil revela continuamente novas camadas da minha consciência, ressaltando as experiências globais compartilhadas por indivíduos negros. Ao percorrer as paisagens históricas do Brasil através das obras de criativos como Heitor dos Prazeres e Carolina Maria de Jesus, tenho plena consciência de que a fundação do país foi cimentada através da escravização forçada de comunidades indígenas e africanas para o trabalho. A história, lamentavelmente, muitas vezes pintou os negros como ameaçadores e improdutivos, obscurecendo as suas contribuições inestimáveis para a sociedade. “The Speed of Grace” é um poderoso esforço contrário para dissipar essas inverdades. O título da exposição, por si só, serve como um chamado, lembrando-nos da urgência em reconhecer as contribuições indeléveis dos afro-brasileiros, africanos, afro-americanos e caribenhos para o tecido social global, contrariando ativamente os esforços históricos que visam apagar essas narrativas. A exposição convida ao diálogo e à introspecção por meio de sua atraente combinação de pinturas, esculturas e instalações, colocando vozes marginalizadas na vanguarda da expressão artística.
“The Speed of Grace” apresenta uma coleção eclética de trabalhos, culminando em uma exposição que cria uma jornada transformadora de exploração do patrimônio, do simbolismo e dos comentários sociopolíticos. Considere-se, por exemplo, a envolvente aproximação de “Flower Vase I (2022)”, de Serge Attukwei Clottey, e “Opa Esin Nile Fun Orun - Cetro da Lança da Terra para o Além (2007)”, de Mestre Didi, situada na entrada da galeria. Ambos exemplificam o uso engenhoso de materiais “não-tradicionais”, repletos de comentários políticos e sociais convincentes. Clottey incorpora engenhosamente galões Kufuor – vestígios de uma crise hídrica durante o regime do ex-presidente de Gana, John Kufuor – transformando-os em pinturas dinâmicas que pulsam com cor e textura. Mestre Didi, por outro lado, utiliza fibras de palma, conchas e contas – cada uma carregando ressonância espiritual – para orquestrar uma sinfonia visual de tensão e beleza. Esta vizinhança, além de evidenciar proezas artísticas, serve como personificação da essência intergeracional e transcultural da exposição. Destaca os intrincados fios que ligam diferentes gerações de artistas e as suas diversas práticas, convidando a novas interpretações das suas contribuições para o cânone artístico. Uma conversa semelhante se desenrola entre a cativante série de colagens de técnica mista de Deborah Roberts, “Mis-Education of Mimi (2013)”, “Hystrix Top” de Amoako Boafo (2023) e a pintura evocativa de Larissa de Souza, “Ilusão (2023)”. Todas as três obras, embora com abordagens variadas, impulsionam conversas sobre representação, presença e subjetividade. Estes diálogos interligados também despertam a contemplação sobre a beleza, a dinâmica do poder, a identidade e a autoconsciência cultural. Muitos dos artistas da exposição apresentam seus trabalhos no Brasil pela primeira vez, tornando a mostra um campo inestimável para trocar ideias e celebrar a intrincada rede de interconexões conceituais, formais e materiais que suas criações facilitam.
Coletivamente, estes artistas redefinem fronteiras e dissipam estereótipos, criando uma mostra que convida os espectadores a mergulhar nas narrativas multifacetadas da diáspora africana. As suas criações transcendem as limitações geográficas, promovendo conexões através da criatividade partilhada, da resiliência e do compromisso de remodelar os diálogos culturais. “The Speed of Grace” prova o poder da arte para unificar, inspirar e transformar. “Grace” (Graça) encapsula a realeza, elegância e autoconfiança inerentes às identidades dessas comunidades. Apesar dos esforços históricos para apagá-los, a sua proeminência perdura e prospera. Suas criações funcionam como mais do que meros exemplos: são pontes que atravessam divisões culturais e ligam cantos díspares do globo. Estes artistas preenchem a lacuna entre os continentes por meio da criatividade partilhada, dando origem a uma linguagem visual poderosa que transcende as barreiras linguísticas e ressoa universalmente. As suas obras, nascidas de uma resiliência inabalável e de uma determinação inabalável de desafiar as convenções, são meios que canalizam a vibração e a tenacidade da diáspora.
Nas pinceladas, costuras e esculturas, uma força dinâmica une o passado e o presente, apagando as fronteiras que antes separavam culturas e gerações. Alimentados por um compromisso inato de remodelar os diálogos culturais, estes artistas construíram uma exposição que mostra os seus talentos artísticos e encoraja os espectadores a envolverem-se com diversas experiências e narrativas. À medida que o público entra neste mundo imersivo de criatividade, é convidado a participar de uma conversa global para refletir sobre as lutas partilhadas, os triunfos e o legado duradouro da diáspora africana. Em essência, “The Speed of Grace” surge como o epítome do potencial transformador inerente à arte, um testemunho da capacidade da criatividade para transpor lacunas, desafiar normas e cultivar mudanças duradouras.
Larry Ossei-Mensah