"Ainda a Abstração" reúne obras do acervo da Simões de Assis que se avizinham pelas múltiplas e variadas possibilidades da arte abstrata gestual, geométrica ou informal. Com artistas de diferentes origens e gerações, a mostra estabelece diálogos transgeracionais inéditos – uma marca do programa da galeria nos últimos anos. Marina Weffort apresenta um novo trabalho de grande dimensão, que tensiona sua escala à delicadeza dos fios quase desfeitos, organizados em linhas ortogonais que se agitam no plano têxtil ao menor movimento do entorno, ao mesmo tempo que vibram pela movimentação do espectador. Ao seu lado, uma obra histórica de Abraham Palatnik, em cartão monocromático, responde igualmente ao deslocamento do observador, só que revelando outras formas das linhas oscilantes verticais que desenham a topografia da obra.
Do outro lado da sala, a Macrocélula de André Azevedo estabelece conexões formais e poéticas com esses trabalhos: ora pelo confronto de tons claros e escuros, ora pela noção de transformação da obra a partir da mudança de ponto de vista – neste caso, criando outras intensidades da cor e revelando novos desenhos. Daí, liga-se esta obra à colagem de Julia Kater e também ao Metaesquema de Hélio Oiticica, cuja composição evoca a composição em grid de Azevedo. Simultaneamente, a obra também se aproxima de maneira notável aos bambus de Ione Saldanha, esculturas que ecoam as estruturas compositivas do artista neoconcreto: colunas segmentadas de maneira rítmica. A obra de Oiticica também estabelece certa interação com duas pinturas abstratas de Rodrigo Andrade, primeiro pelas tonalidades azuis e, depois, pela composição geométrica, enquanto as aquarelas com têmpera de Gonçalo Ivo dialogam cromaticamente com os bambus de Saldanha a partir dos lilases, amarelos, laranjas e amarelos.
Por fim, há um conjunto surpreendente que avizinha Tomie Ohtake e Emanoel Araujo. A fina curva ascendente de gesto tão preciso quanto espontâneo sobre o vermelho vibrante da pintura de Ohtake se opõe ao totem geométrico erguido por formas triangulares de Araujo, potencializando o jogo entre curva e ângulo agudo, matizes quentes e frios, gestualidade e racionalidade, bi e tridimensionalidade. Como um todo, a mostra nos ajuda a reiterar a força da abstração dentro da arte brasileira, como uma linguagem que atravessa décadas, diferentes suportes, outras materialidades, e narrativas divergentes, mas que se une no interesse pelo que a falta da figura apresenta como possibilidade visual.